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Consequências do bullying na escola

Há três semanas, o vídeo do australiano Quadan Bayles viralizou na internet e trouxe novamente à tona discussões sobre bullying na escola. Se você não acompanhou a história, a mãe de Quandan publicou em suas redes sociais um vídeo do garoto de apenas nove anos chorando após sofrer bullying por conta do seu nanismo. A postagem teve mais de 14 milhões de visualizações e comoveu a internet. A família recebeu muitas mensagens de apoio, inclusive de famosos, como o ator Hugh Jackman, o jogador de basquete Enes Kanter e o comediante Brad Williams, que também tem acondroplasia (forma mais popular de nanismo).

Mais recentemente, na Inglaterra, uma mãe precisou trocar seu filho de escola depois que o garoto de 12 anos sofreu agressões físicas por três meses. A mãe relata que o menino, que tem autismo, teve seu lanche roubado, suas roupas rasgadas e constantemente voltava para casa com hematomas e ferimentos. 

Discutir o tema bullying é importante porque suas consequências podem afetar o desenvolvimento pessoal, social, afetivo acadêmico e psicológico das crianças e jovens. De modo geral, as vítimas têm vergonha e medo de pedir ajuda, tornando o processo ainda mais delicado para educadores e pais. 

Segundo Ana Paula Camilo Ciantelli, psicóloga e doutora em psicologia do desenvolvimento e aprendizagem pela Unesp, cada criança reage de maneira diferente à agressão. “Dentre as reações comuns estão o aparecimentos de emoções e sentimentos como a raiva, a frustração, o medo e a vergonha pela humilhação que passaram”. Esses sentimentos contribuem para o desenvolvimento ou aumento da ansiedade, ataques de pânico, depressão, insegurança e diminuição da autoestima. A criança aos poucos se isola socialmente e rejeita cada vez mais sua própria identidade. 

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Origem do termo

A palavra bullying é um substantivo original da língua inglesa e derivado do verbo to bully, que significa “machucar ou ameaçar alguém mais fraco para forçá-lo a fazer algo que não quer.” Não existe tradução da palavra para o português mas o termo é mundialmente utilizado para referir “todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas.”

Cyberbullying
Muitas vezes o bullying extrapola os limites da escola e chega aos ambientes virtuais.

O comportamento agressivo, seja físico ou verbal, é exercido por alguém do mesmo nível hierárquico, diferentemente do que ocorre com o assédio moral. É importante saber diferenciar o bullying e os conflitos comuns do ambiente escolar. O bullying é uma agressão proposital, feita com frequência e cujos objetivos são humilhar, diminuir e ridicularizar as vítimas.

O que diz a lei 

Em 2015 foi sancionada no Brasil a Lei Nº 13.185/ 2015, que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática. Os oito artigos da lei propõem ações para erradicação do bullying e tornam a luta contra a intimidação sistêmica uma política pública de educação.

Importa esclarecer que o bullying por si próprio não constitui crime. Por outro lado, as ações caracterizadas como tal podem envolver a prática de atos infracionais pelos agressores, uma vez que as situações de bullying envolvem lesões corporais, ameaças, dano ao patrimônio e agressões verbais (injúrias). 

Do ponto de vista civil, a advogada Julia Cunha esclarece que “as práticas de intimidação sistemática podem gerar demandas de indenização por danos materiais e morais. Esse último tendo em vista o sofrimento e a humilhação que a vítima tem no seu ambiente de estudo.” Os danos morais tem considerável relevância porque a escola é um ambiente frequentado diariamente pela vítima, sendo assim, seu principal círculo de convivência.

Sob o mesmo ponto de vista, Julia destaca também o papel de cada uma das partes envolvidas na situação, especialmente o da escola, que tem por função básica a prestação de serviço educacional e pode ser responsabilizada pela prática do bullying. 

Bullying na mídia

Embora o tema esteja aparecendo mais frequentemente nos noticiários, a lei ainda é pouco conhecida. “Não corresponde à realidade afirmar que a população tem amplo acesso e conhecimento do Programa de Combate à Intimidação Sistemática”, afirma. Julia e Ana Paula acreditam que os canais midiáticos precisam realizar um trabalho mais efetivo de divulgação da lei.

Em complemento, a advogada afirma que mesmo com a disponibilidade de materiais de aprendizado, o bullying ainda não é tratado da maneira correta. “Uma rápida pesquisa na internet e nas redes sociais pode nos apresentar a utilização incorreta ou imprecisa do termo para situações que não configuram a prática em questão.”

Lidando com o bullying na escola 

A escola deve participar ativamente na construção de ações e medidas preventivas contra o bullying. No momento em que alguma situação for detectada, gestores e professores devem intervir imediatamente. As famílias de ambas as partes devem estar presentes no processo de resolução do conflito.

Bullying na escola

Antes de tudo, Ana Paula orienta que o diálogo com as crianças e suas famílias deve sempre ser calmo, sem tom acusador. “Deve ser uma conversa que não aponte dedos nem coloque culpa sobre os pais, mas que busque compreender melhor a vida desses sujeitos para além dos muros da escola.” A psicóloga afirma que tanto agressor quanto alvo precisam de apoio psicológico. A escola deve manter um diálogo frequente com os pais para compreender a relação familiar desses alunos. “Estudos indicam que agressões praticadas por crianças ou jovens podem ser reflexos da violência que presenciam e vivenciam nos seus lares.” 

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Ações de conscientização 

A falta de conhecimento costuma ser a motivação para as agressões. Desse modo, educadores desempenham um papel fundamental na quebra de ciclos reprodutivos de preconceito. Ana Paula resume que “o bullying é uma manifestação de preconceito e intolerância com as diferenças. Essa diferenças vão contra um padrão de ser humano idealizado. As diferenças podem ser raciais, sociais, econômicas, religiosas, sexuais, vinculadas ao corpo, a deficiência, dentre outras.”

Não há nada de errado em ser diferente. Portanto, para promover a reflexão desse discurso, a gestão escolar deve promover palestras, encontros, rodas de conversas e campanhas envolvendo pais, crianças e comunidade. É papel da escola garantir a construção de um ambiente seguro para diálogo e esclarecimento de dúvidas. 

Para Ana Paula, “devem ainda ser trabalhados valores morais positivos como justiça, igualdade, solidariedade e liberdade. Valorizando sempre o respeito, os direitos humanos, a diferença e a identidade do outro”. Mas esse trabalho será efetivo somente se também forem estimuladas “práticas de cooperação, de resolução de problemas e conflitos, de empatia, de participação comunitária e de convivência. Somente assim os sujeitos se perceberão ativos no processo de transformação da realidade atual e poderão construir uma sociedade menos violenta e mais respeitosa à diversidade.”, completa a psicóloga. 

Ao redor do mundo

Um relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) mostra que ao redor do mundo, cerca de 150 milhões de jovem entre 13 e 15 anos já foram vítimas de violência por parte dos colegas. Esse número representa metade do número total de estudantes nessa faixa etária. Dados de outra pesquisa realizada pelo UNICEF mostram que um em cada três jovens de 30 países afirma ter sido vítima de bullying online, com um em cada cinco relatando ter saído da escola por conta do cyberbullying e violência. 

O Manifesto Jovem #ENDviolence foi apresentado no Fórum Mundial de Educação, em janeiro de 2019, e é um apelo conjunto realizado por mais 100 jovens do mundo todo pelo fim da violência nas escolas. O manifesto reúne dois princípios, três comprometimentos e sete demandas para nortear crianças, jovens, adultos e governos a tornarem o ambiente escolar, um ambiente mais seguro. 

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