O que muda com a nova Política Nacional de Educação Especial? Por que lideranças e organizações classificaram o Decreto como excludente e ilegal? Do que se trata a educação inclusiva? Preparamos esse post para esclarecer essas e mais algumas questões envolvendo a decisão tomada pelo Governo Federal.
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A nova PNEE (Decreto 10.502) do governo nacional foi publicada no dia 1º de outubro e pretende ampliar o atendimento a 1,3 milhão de estudantes com deficiência. Em resumo, a medida tira da escola comum a obrigatoriedade de realizar a matrícula desses alunos e permite a volta do ensino regular em escolas especializadas.
Chamado por especialistas de “decreto da exclusão”, a Política Nacional de Educação Especial foi duramente criticada por entidades e especialistas ligados ao ensino inclusivo. Isso porque a ideia de separar os alunos com deficiência em turmas e escolas especializadas vai contra a proposta de inclusão. A matrícula em escolas regulares oferece um espaço de convivência amplo e auxilia na redução de estigmas.
Nesse sentido, a revogação do decreto foi solicitada pouco depois da sua assinatura. No começo de outubro, onze Projeto de Decreto Legislativo (PDL) foram propostos conta o decreto na Câmara dos Deputados e dois no Senado. Entretanto, no último dia 25, a Advocacia-Geral da União (AGU) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer em defesa PNEE.
De acordo com a nota técnica, o decreto não propõe uma “política de segregação” dos estudantes com deficiência. “Não merece prosperar alegação de que o decreto questionado estaria veiculando política de segregação dos educandos com deficiência dos demais por meio da previsão de prestação dos serviços de educação através de escolas especializadas”, defende a AGU.
Críticas a nova Política Nacional de Educação Especial
A nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE): Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida foi elaborada pelos Ministérios da Educação e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Sua proposta de incentivo às escolas especiais voltadas para crianças com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação altera uma política proposta em 2008.
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI) preconizava que esses alunos fossem matriculados em turmas regulares e que pudessem contar com o apoio complementar especializado se necessário. Dessa forma, as atividades voltadas para a educação especial eram realizadas sempre no contra-turno. Por isso, a PNEE é vista e criticada por ser um decreto que segrega ao invés de incluir.
Os dados do último Censo Escolar, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mostram que o número de matrículas em classes comuns de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades, chegou a 1,2 milhão em 2018. Esse número representa um aumento de 33,2% em relação a 2014.
Além disso, especialistas também apontam que o Decreto viola a Constituição Federal. Em seu artigo 206, a Constituição prevê a educação como princípio a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. Em adição, o artigo 208 estabelece que o atendimento educacional especializado será preferencialmente realizado na escola regular.
O que diz o parecer enviado ao STF
A AGU nega que a nova Política Nacional de Educação Especial seja uma afronta aos esforços da educação inclusiva. O governo argumenta que o Decreto “explicitamente prevê a prestação da educação especial inclusiva nos estabelecimentos regulares de ensino, não havendo qualquer motivo que autorize a interpretação de que a política veiculada pelo ato em referência teria estabelecido que o serviço educacional em referência seria ministrado exclusivamente em escolas especializadas”, disse.
Sobre a menção dos artigos da Constituição, a AGU respondeu que o documento não sugere que a educação especial seja realizada “exclusivamente” nas escolas regulares, mas sim “preferencialmente” nestes locais. “Note-se que o legislador constituinte utilizou o vocábulo ‘preferencialmente’ no inciso III, do art. 208, não se podendo depreender da leitura do supracitado mandamento constitucional que o legislador constituinte tenha determinado que a educação especial deva, ‘exclusivamente’, ser ministrada em estabelecimentos educacionais regulares”, ponderou a nota.
“Ao contrário, o que se pode extrair de tal comando da Constituição Federal é justamente a existência da possibilidade de que a educação especial venha a ser ministrada em estabelecimentos especializados, como uma alternativa às instituições da rede regular de ensino, quando houver necessidade para tanto, conforme estabelece a política veiculada no decreto”, completou a AGU.
Posicionamento do MEC
Em outubro, o Ministério da Educação (MEC) também foi questionado sobre a nova Política Nacional de Educação Especial. A resposta foi dada por meio da seguinte nota:
A PNEE apresentada pelo Governo Federal amplia a área da educação especial, oferece aos sistemas educacionais possibilidades de criar alternativas educacionais além das escolas comuns inclusivas, como: escolas e classes especializadas, escolas e classes bilíngues de surdos, amplia alternativas para viabilizar o atendimento educacional especializado como uma diretriz constitucional (art. 208 da Constituição Federal de 1988).
Um dos princípios fundamentais é o direito do estudante e da família na escolha da alternativa mais adequada para a educação do público-alvo desta Política.
O objetivo é garantir aos estudantes com deficiência, com transtorno globais do desenvolvimento e com altas habilidades uma formação integral.
Segundo a Agência Brasil, o Ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou que “ um dos principais norteadores dessa política nacional é a valorização das singularidades e dos direitos dos estudantes e das famílias no processo de decisão sobre as alternativas mais adequadas para o atendimento educacional especializado”.
Diferenciais da educação inclusiva
A educação inclusiva propõe a implantação da educação especial na educação regular. Nesse sentido, toda escola deve matricular todos os alunos, sem distinções, garantindo aprendizagem para todos, sem distinções, respeitando suas diferenças e limitações. São grupos focais da educação inclusiva: os alunos com deficiência; alunos com transtornos globais do desenvolvimento ou transtorno do espectro autista; e alunos com altas habilidades ou superdotação. Os cinco princípios da educação inclusiva são:
1. Toda pessoa tem o direito de acesso à educação
2. Toda pessoa aprende
3. O processo de aprendizagem de cada pessoa é singular
4. O convívio no ambiente escolar comum beneficia todos
5. A educação inclusiva diz respeito a todos
A educação inclusiva valoriza a diversidade acima de qualquer coisa e afirma a necessidade de igualdade de oportunidades, sejam quais forem as questões étnicas, sociais, culturais, intelectuais, físicas e sensoriais. Se por um lado a educação especial estigmatiza as necessidades especiais e deficiências, por outro a educação inclusiva oferece uma classe livre de preconceitos e que valoriza as diferenças.
Dessa forma, pode-se dizer que a nova PNEE também representa um retrocesso em relação a concepção de inclusão escolar como direito humano.